sexta-feira, 14 de março de 2008

Que Rei sou eu?

As comemorações dos 200 anos da chegada da Corte Portuguesa ao Brasil, colocam D. João VI no centro das discussões, ensejando opiniões diversas sobre sua figura controversa. É inegável o bem que fez ao Brasil a instalação nessas terras da sede do reino. O episódio foi fundador da nação.

Com a Corte, chegou a livraria real, precursora da Biblioteca Nacional. Vieram os prelos que permitiram instalar a Imprensa Régia, abriram-se os portos e iniciaram-se os cursos de medicina na Bahia e no Rio de Janeiro. Fundaram-se o Banco do Brasil e o Jardim Botânico. Estabeleceram-se os pressupostos que preparavam a Independência.

Com tudo isso, a figura de D. João VI nunca se livrou de uma imagem caricata, de um melancólico comedor de frangos, alheio às questões de Estado, amargurado pela demência da mãe, a infidelidade e as intrigas políticas da mulher. Um Rei vacilante, inseguro, que deixou para a última hora a decisão de partir para o Brasil. Medida que reflete uma estratégia esperta que lhe salvou o Reino, ou apenas uma fuga covarde diante da tropas de Napoleão?

Ajuda a pensar o que aconteceu à vizinha Espanha, com a destituição do soberano e a implantação no poder do irmão de Napoleão. É igualmente importante meditar sobre a resistência que opôs ao absolutismo, encarnado nas figuras da esposa Carlota Joaquina e do filho D. Miguel. Governou com vários ministros influentes, mas nunca entregou o poder a um só, como fizera seu avô D. José, em cujo reinado aconteceu o consulado do Primeiro Ministro, Marquês de Pombal. Dele, disse Oliveira Martins, "desconfiava sempre, e de tudo, de todos; e se era indeciso, por ser fraco e inepto, era-o também por esperteza ou dissimulação". Quando morreu, o Embaixador da França em Portugal escreveu que desaparecera um homem bom e desgraçado.

Arguto ou tolo, esperto ou néscio, o fato é que análise justa sobre sua personalidade e feitos, só se fará consideradas as circunstâncias em que viveu e reinou. E tais circunstâncias, inevitavelmente, terão que se remeter às críticas que lhes sejam feitas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Dr. Lúcio:
Essas suas reflexões sobre a vinda da família real para o Brasil, estão excelentes.
E essa sua honesta simpatia pela figura de D. João VI, eu, particularmente, tenho adorado.
Fico, às vezes, imaginando como o senhor convive tão bem com esses trogloditas da política partidária nacional.
Isso não lhe traz um peso?
Sou sua admiradora eterna.
Ivana Maia

Anônimo disse...

Dr. Lúcio,
Concordo com o Sr. sobre os benefícios da vinda da Família Real portuguesa para o Brasil.
Na escala em Salvador – aonde chegou em 22 de janeiro de 1808 tendo ali permanecido por quase um mês – a primeira medida de Dom João foi a abertura dos portos da colônia às nações amigas. Quebrava-se, assim, o monopólio do comércio com Portugal. Ainda em Salvador, Dom João VI criou o ensino da medicina no Brasil, com a fundação da primeira Escola Médica do país. Concedeu licença para construção de duas fábricas, uma de vidro e outra de pólvora, além de ordenar a feitura do plano de defesa daquela cidade.

Já no Rio de Janeiro, Dom João consolidou aquela cidade como o centro de decisão da colônia. Editou o regulamento da Administração Geral dos Correios, criou as Escolas de Medicina e a Superior de Técnicas Agrícolas; um laboratório de estudos e análises químicas; as Academias: Real Militar (que incluía cursos de Mineração e Engenharia Civil) e a de Guardas-Marinha. Ali, o príncipe regente revogou um alvará que proibia a fabricação de qualquer produto no Brasil. Surgiram, então, as primeiras indústrias brasileiras: a fábrica de ferro, em Congonhas do Campo, moinhos de trigo, fábricas de tecidos, cordas, pólvora e barcos. Dom João criou ainda: o Supremo Conselho Militar, a Intendência Geral da Polícia, o Erário Régio, o Conselho da Fazenda, o Corpo da Guarda Real e o Tribunal da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, ou seja, o Judiciário Independente do Brasil. Posteriormente, o príncipe regente criou o Banco do Brasil e várias instituições culturais, como a Biblioteca Nacional, o Jardim Botânico, o Real Gabinete Português de Leitura, o Teatro São João, o primeiro jornal impresso no Brasil (a Gazeta do Rio de Janeiro), a Imprensa Nacional, o Museu Nacional, a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios.

O príncipe regente revogou uma lei de 1733, que proibia a construção de estradas na América portuguesa, a pretexto de combater o contrabando de ouro e pedras preciosas. Simultaneamente, determinou a abertura de novas estradas, o que veio a romper o isolamento em que viviam as províncias da colônia.

No entanto, o maior de todos os benefícios prestados por Dom João VI ao Brasil foi, sem nenhuma dúvida, a manutenção da integridade territorial do nosso país.

Armando Lopes Rafael (historiador)
Crato - CE