terça-feira, 25 de julho de 2017

segunda-feira, 24 de julho de 2017


Aquarela: Côca Torquato, Retalho de um limoeiro, 2007.
(Postais do Almocreve - Limoeiro do Norte/CE)

O grande "slogan" da educação mundial

Temos escolas do Século XIX, para ser simpático, 
porque algumas são do Século XVIII, 
com professores do Século XX, 
para alunos do Século XXI."

Director de uma escola portuguesa, 2017 


A frase acima reproduzida constitui uma variante, diria eu, mais radical, daquele que se tornou e se afirmou como o grande slogan da educação mundial: "temos uma escola do século XIX, com professores do século XX, para alunos do século XXI".

As palavras que lhe dão formam centram-se na premência de construção, na escola, do (tal) "homem novo": o "homem" liberto dessa inutilidade que é o passado e projectado para um presente/futuro repleto de possibilidades.

Esta é, porém, a face mais visível do slogan, pois, à medida que se vai explorando, revela toda uma "filosofia" não sei se complexa se linear, mas marcadamente imbricada, redundante, quando não contraditória, e sobretudo, desconcertante sob o ponto de vista conceptual.

Discuti-lo daria um tratado e um blogue não permite tal. Permite, no entanto, deixar, um apontamento do professor espanhol Ricardo Moreno Castilho, publicado no seu recente livroLa conjura de los ignorantes, páginas 118 e seguintes.

"Por muito actuais que as teorias da relatividade e quântica sejam (e é certo que estão constantemente a ser feitas novas descobertas) continua a ser necessário conhecer a teoria de Newton. Em primeiro lugar, porque (...) continua a ter validade e, em segundo lugar, porque sem a entender bem é impossível entenderem-se as teorias posteriores. Por muito antiquada que possa parecer, não há razão para deixar de a estudar (...). 
Passemos às humanidades. Já não se devem ler as obras de Sófocles, de Shakespeare ou de Cervantes? E no caso de se lerem, devemos explicá-las à luz das mais modernas correntes da crítica literária, de modo a não nos mostrarmos antiquados ou levar os alunos a aprender a amá-las e a desfrutá-las, como se tem feito sempre? Os bons professores de literatura do século XX aprenderam a gostar de Dom Quixote, que mal tem (...) se transmitirem o mesmo gosto aos seus alunos, do século XXI? 
E quanto à história, já não é preciso estudá-la? Se a história é o conhecimento do passado, do que já é antigo, nunca pode tornar-se antiquada (...). 
Não podemos adaptar-nos, nem interpretar, nem mudar o mundo em que vivemos se não o conhecermos bem. E o nosso mundo é um palimpsesto escrito sobre o Romantismo, que foi escrito sobre o Iluminismo, que foi escrito sobre a Contra-reforma, que foi escrito sobre o Renascimento, que foi escrito sobre a Idade Média, que foi escrito sobre o mundo latino, que, por sua vez, foi escrito sobre a Grécia, cuja cultura é devedora da egípcia e da suméria. 
Só conhecendo o passado podemos conhecer-nos a nós mesmos e ao nosso presente, porque somos o resultado de tudo o que nos precedeu (...). 
Somos herdeiros de um imenso caudal de sabedoria que, desde há quase três mil anos, foi guardado com muitas dificuldades (...) e que não se torna obsoleto. 
A nós, professores, cabe-nos a difícil e bela tarefa de conservar e transmitir esse legado aos nossos alunos para que também eles possam conhecê-lo, amá-lo e desfrutá-lo. 
É um acto de barbárie interceptar esse legado apenas e só para não parecermos estar ancorados no passado e cultivarmos uma imagem de vanguardistas, inovadores e progressitas."
Fonte: http://dererummundi.blogspot.com.br/2017/07/o-slogan-da-educacao-mundial.html