domingo, 1 de abril de 2007

SUDENE*

Este momento oferece, para nós nordestinos em particular e brasileiros em geral, a mesma dimensão histórica daquele dia em que o Presidente Juscelino Kubitschek oficializou a criação da SUDENE, em 15 de dezembro de 1959, há quase quarenta e quatro anos atrás. Nessa iniciativa que nasceu politicamente ambiciosa, Juscelino teve a colaboração intelectual do economista Celso Furtado, um ilustre filho do sertão paraibano.
As propostas criadas por Furtado para a SUDENE ajudaram a mudar o Nordeste, que em alguns momentos provou ter uma economia mais dinâmica que a do Brasil, embora os avanços na área social sempre tenham se mantido longe do que aspiramos e merecemos. Com a participação da SUDENE, a agricultura e a indústria nordestina foram contempladas com projetos modernizadores e, sem ela, dificilmente tais projetos iram adiante.
Após décadas de atuação, a SUDENE foi extinta, em maio de 2001, e substituída pela ADENE, que permaneceu apenas uma sigla, sem existência de fato. Agora, a retomada da SUDENE, com o seu nome original, chega como um acontecimento de poderosa carga simbólica, e é também um gesto de reconhecimento do Presidente Lula aos serviços de um órgão que foi um marco referencial no planejamento regional brasileiro.

Com a recriação da SUDENE, o Presidente cumpre um de seus compromissos de campanha, que é o de apoiar, como faz a União Européia e tantos outros blocos e países do mundo, as suas regiões mais vulneráveis.
A SUDENE nasceu com o ideal de contrabalançar, através da coordenação dos investimentos federais e com o auxílio dos incentivos fiscais, a escandalosa situação de desequilíbrio existente entre as várias regiões do País. Para isso, chegou a coordenar os vários órgãos do Governo Federal operando no Nordeste, comandando recursos consideráveis, administrando o FINOR e participando das decisões sobre o FNE.
Um conjunto de fatores levou a SUDENE a perder gradualmente o poder de coordenação de iniciativas inovadoras, capazes de contribuir para o desenvolvimento do Nordeste. A falta de fiscalização adequada; os desvios de verbas; a criação de sucessivos programas especiais, sem continuidade e sem consulta aos governadores; e a escassez de recursos e de pessoal qualificado formaram um quadro desfavorável que levou ao esvaziamento da SUDENE. Evitar a repetição de tropeços e equívocos passados, daqui para frente, é uma prerrogativa básica, para que as providências e decisões não fujam do controle da Superintendência e das lideranças locais.
Como cidadão e como governador do Ceará, eu tenho acompanhado de perto os debates sobre a recriação da SUDENE, conduzidos nesse momento pelo Ministério da Integração Nacional e liderados pelo Ministro Ciro Gomes. O que está se propondo, portanto, é fruto de um trabalho coletivo entre as lideranças regionais e o Governo Lula.

Nessa discussão, ficou comprovado que as causas do desequilíbrio espacial e social entre regiões e estados, meio rural e urbano, o centro e a periferia, são velhos conhecidos de todos nós. A questão não mais reside na busca de uma explicação para o fenômeno, mas em intervenções deliberadas que permitam minimizar os efeitos das profundas diferenças.
Qual deve ser a atitude do Estado frente ao problema regional, quando algumas tradicionais formas de atuação se mostram ultrapassadas? Como ordenar as ações do setor público no contexto democrático de uma economia aberta e competitiva? A proposta hoje apresentada poderá equacionar essas questões, com o apoio político decisivo e continuado do Presidente da República em parceria com os governadores da Região.
Acredito que as desigualdades econômico-sociais do Brasil são também advindas do fato de que, durante anos, o País não cultivou uma visão de longo prazo e grande alcance. Infelizmente, os assuntos emergenciais absorvem muito das nossas energias, enquanto os problemas estruturais se acumulam, agravando-se. A SUDENE, portanto, tem de pensar o Nordeste do futuro.
O Presidente Lula está iniciando um processo de alteração do modelo de desenvolvimento. De um lado, é preciso criar condições para o livre funcionamento do mercado, estimulando os investimentos privados e públicos que produzem bens e serviços, criam empregos e geram renda. De outro, é preciso motivar as iniciativas locais e os empreendimentos da comunidade, para promover a cidadania e o lugar onde se vive.

No Ceará, direcionado por essa visão, o Governo atual criou a Secretaria de Desenvolvimento Local e Regional, que trabalhará em íntimo contato com a nova SUDENE, buscando atenuar as enormes disparidades que existem entre a Região Metropolitana de Fortaleza e o restante do Estado. Como exemplo, Fortaleza e seu entorno concentram 40% da população do Ceará e participam com 62% do seu PIB.
Acredito que um dos papéis da nova SUDENE seja recuperar sua dívida para com o semi-árido nordestino. O apoio à produção de grãos, à fruticultura irrigada e às explorações tradicionais do sertão, deve ser incondicionalmente reforçado, para que essas atividades atinjam o nível ideal de auto-suficiência, contando, inclusive, com o projeto de transposição das águas do rio São Francisco, devidamente revitalizado. E aqui queria destacar a criação pelo Presidente Lula de um Grupo de Trabalho, no último dia 15, que levará adiante essa questão, outra promessa de campanha.
Por último, gostaria de agradecer a presença honrosa dos governadores e demais autoridades, registrando a grande esperança que deposito nessa nova proposta política de desenvolvimento regional, com dimensão e origem verdadeiramente nacionais, e que, ao invés de apenas parcialmente contemplar as regiões mais atrasadas como áreas-problema, vislumbra o conjunto de todas as regiões brasileiras, com as suas peculiaridades, diferenciações, potencialidades e demandas próprias, sob a perspectiva histórica de um Brasil em um novo tempo.

* Solenidade de Recriação da SUDENE. Auditório do Banco do Nordeste. Fortaleza (CE) em 28/07/2003
** Governador do Estado do Ceará (2003-2007)

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