segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Esgoto

Os rios e córregos da cidade de São Paulo recebem, diariamente, uma descarga de 500 litros de esgoto in natura, por segundo. Isto apenas das ligações detectadas e que podem ser regularizadas. O fluxo jorra de, pelo menos, 100 mil ligações clandestinas.

A notícia me remete ao livro que leio no momento, O Mapa Fantasma, de Steven Johnson, que narra como dois homens, o médico John Snow e o padre Henry Whitehead, mediante meticulosa investigação, conseguiram identificar a origem e a forma de transmissão do cólera, em 1854, quando uma epidemia da doença matou cerca de 50.000 pessoas, em Londres.

Na época, se desconhecia a transmissão da doença pela via hídrica, e especulava-se sobre a contaminação das pessoas pelo ar, a chamada teoria miasmática. Reforçava esta impressão, o fedor que invadia a cidade populosa, desprovida de um sistema de esgotamento sanitário.

A construção de uma rede de canalização que aliviasse a fedentina, escoando resíduos fecais não tratados, inundou o Tâmisa de excrementos. Deste mesmo rio imundo, saia a água que abastecia os londrinos. Estavam criadas as condições para desencadear a terrível epidemia.

O livro a que me referi, narra, de forma interessante, como foi escrita esta importante página da história da saúde pública.

Ele mostra como a epidemiologia se vale de técnicas detetivescas. O atraso medieval do saneamento básico em nosso País, guardaria, entre outros motivos, a aversão de nossos homens públicos às obras enterradas.

3 comentários:

Anônimo disse...

Dr. Lucio, também li este livro recentemente. Chama a atenção não só a obstinação de Snow, mas também a forma rigorosa e cuidadosa que ele usa para investigar a origem do contágio. Um exemplo claro do uso do método científico, que já vinha sendo usado na Física e Química, mas pouco na Biologia e Medicina. Impressionante é que ainda hoje existam mapas fantamas, especialmente em cidades brasileiras.

José Sales disse...

Estamos discutindo justamente este assunto da qualidade de vida, palnejamento urbano e saneamento ambiental. Relembrando a discussão desde a Baixa Idade Média e as Leis Sanitárias do Norte da Itália de 1692 - "Legere Sanitari" - que foram os antecedentes do que entendemos hoje por códigos de obras e edificações.

Célio Ferreira Facó disse...

País dividido, a reunir características umas de pura civilização, outras de quase selvageria – Belíndia, dizem os economistas – o Brasil quer orgulhar-se de sua São Paulo. Inscreve-a entre as metrópoles do mundo. O Tietê, porém, atravessando-a com águas pútridas, convida a reflexões sobre a culpa e o caráter mesmo de sucessivos governos que dele não cuidaram jamais. Às suas margens, edifícios de morar, às vezes destinados somente aos mais endinheirados, não podem senão abrir suas janelas para a visão do esgoto e do mau cheiro a escorrer pelo velho rio. Neste cenário medram doenças que o mundo civilizado há muito controlou, afastou.