Lúcio Alcântara:
“Sempre me interessei pelo passado, pela memória, o que guardei ou recuperei olhando para trás” (Foto: Denise Mustafá)
Pequenos poemas, às vezes cortantes, outros amorosos. Lembranças de infância. Memórias nunca são fáceis, as marcas do passado doem, são repletas de perdas. Retratos pendurados numa parede. Ausências jamais preenchidas. Um mundo que se fechou nos jamais. A recordação tem seus mistérios. Lúcio Alcântara se enreda pelo discurso da memória. Ainda em pequenos poemas - ou talvez, nem poemas - frases criativas, mas repletas de saudades - lembrar não é viver. “Na mesa austera da casa da minha avó não havia madeleines, mas a coalhada no prato fundo é puro Proust”, escreveu em “A Casa da Minha Avó”, seu primeiro livro de ficção. Foi nesses pequenos retalhos, frestas de lembranças que Lúcio se “afogou” para escrever “A Casa da Minha Avó”. Agora, repete a fórmula em “O Rio da Minha Infância”, obra que lança hoje no Ideal Clube. A seguir, trechos da entrevista que Alcântara concedeu ao Diário.
Pequenos poemas, às vezes cortantes, outros amorosos. Lembranças de infância. Memórias nunca são fáceis, as marcas do passado doem, são repletas de perdas. Retratos pendurados numa parede. Ausências jamais preenchidas. Um mundo que se fechou nos jamais. A recordação tem seus mistérios. Lúcio Alcântara se enreda pelo discurso da memória. Ainda em pequenos poemas - ou talvez, nem poemas - frases criativas, mas repletas de saudades - lembrar não é viver. “Na mesa austera da casa da minha avó não havia madeleines, mas a coalhada no prato fundo é puro Proust”, escreveu em “A Casa da Minha Avó”, seu primeiro livro de ficção. Foi nesses pequenos retalhos, frestas de lembranças que Lúcio se “afogou” para escrever “A Casa da Minha Avó”. Agora, repete a fórmula em “O Rio da Minha Infância”, obra que lança hoje no Ideal Clube. A seguir, trechos da entrevista que Alcântara concedeu ao Diário.
O senhor sempre foi um homem ligado aos livros. Agora, não apenas escreve seus primeiros poemas, como funda uma editora, a Labirinto. Sonho antigo?
Sempre tive desejo de ter uma editora, uma livraria e um bar. Muito mais sonho do que projeto realizável. Tive várias experiências editoriais à frente dos Institutos Tancredo Neves e Teotônio Vilela, Conselho Editorial do Senado, que tive a honra de presidir, e a própria Fundação Waldemar Alcântara. No livro ´A Casa da Minha Avó´ apresentei a Editora Labirinto e sua linha de trabalho. Iniciativa sem fins comerciais, é apenas uma atividade da Fundação Waldemar Alcântara.Nestes dois livros, ´A Casa da Minha Avó´ e ´O Rio da Minha Infância´, o senhor percorre momentos da sua vida. No primeiro, são lembranças esparsas - móveis, relógio, chão da sala -, quase a memória involuntária proustiana. O segundo, ´O Rio da Minha Infância´, é repleto de contrastes, paradoxos.
Poderia explicar melhor o contexto em que foi escrito estes dois livros, bem como o seu processo de criação?
Algumas pessoas que leram ´A Casa da Minha Avó´ se surpreenderam com o texto, que consideraram algo melancólico. Não imaginavam, me disseram, que eu fosse uma pessoa triste. Não acho que o seja, embora me considere reservado, tímido mesmo. Não é um comportamento que se espere de políticos, geralmente expansivos, conversadores, alguns até histriônicos. Sempre me interessei pelo passado, pela memória, o que guardei ou recuperei olhando para trás. As duas publicações foram concebidas e realizadas enquanto estava no governo, embora só agora esteja lançando ´O Rio da Minha Infância´. Talvez porque estando cercado de muitos, estivesse, de fato, sozinho. A parceria com a Joana obedece a um projeto gráfico que espero irá continuar. Buscamos uma sinergia entre imagem e texto, muito bem executada pela Expressão Gráfica.
Carlos Lacerda deixou um belo livro de depoimentos, bem como escreveu ´A Casa do Meu Avô´. Quer dizer, ele remexeu mais profundamente seu baú de memórias. O senhor pretende escrever as suas?
No momento não penso nisso, embora tenha muitas anotações. Alguém já escreveu que a descrição da vida não vale a sensação da vida. Por ora, prefiro guardar o meu olhar sobre os outros para o futuro.
Parece que o senhor está vivendo no espaço da saudade, tem muito a contar, a narrar. Estes dois pequenos livros seriam apenas o começo? Pedro Nava, também médico, escreveu suas memórias depois dos 60 anos. E, ao contrário de muitos memorialistas, revolveu seu baú de ossos sem meias palavras. Machucou amigos, inimigos e familiares. O senhor faria o mesmo?
A verdade pode não ser relativa, mas é múltipla. A de cada um, várias, e a verdadeira, muitas vezes desconhecida. Por mais que se tenha memória e critério, não é possível reproduzir integralmente o passado, são apenas retalhos vividos que ressurgem. Para mim Pedro Nava é incomparável como memorialista, pois falou de pessoas, cenários, costumes, com espantosa liberdade. Quem me dera chegar lá!
Quais os livros que mais lhe tocam?
Não tenho livro de cabeceira a não ser a Bíblia, que costumo ler aleatoriamente. Conforme o momento que esteja vivendo, ou o trabalho que realize, posso ter um ou mais livros à mão. No momento tenho três, um deles um livro policial.
A dobradinha política e literatura dá certo?
Comigo dá, porque sou mais leitor do que autor. Com freqüência fico pensando como certos políticos do passado construíram obras literárias extensas e de qualidade. Não creio que com as exigências da política contemporânea isso ainda fosse possível. De qualquer forma, a literatura me ajudou muito a conviver com as agruras da política.
A literatura tem seus códigos, máscaras, artifícios de linguagem. A linguagem está ligada às estruturas de poder. Como o senhor definiria a literatura?
Literatura é a metáfora. A vida em ficção. A ´Comédia Humana´, de Balzac, e ´Madame Bovary´, de Flaubert, são bons exemplos do que afirmo.
Tivemos a Semana de Arte de 22, a Geração de 45, enfim, nossa literatura do Romantismo (século XIX) até hoje parece buscar sua identidade. O senhor acha que, como a nossa República (ainda em construção), temos também, uma literatura em busca de sua identidade?
Cada época tem seus intérpretes. Esse período também terá os seus na ficção, na poesia e no ensaio. A globalização, o terrorismo, a cibernética, a integração econômica, a formação de blocos de países, a emigração maciça de pobres, são fenômenos que já estão e irão, cada vez mais, inspirar novos escritores. O cardápio é rico e aguarda talento e disposição para explorá-lo.O senhor seria um tradicionalista em meio a um mundo globalizado, pós-moderno?Não me considero um tradicionalista. Basta olhar detidamente para minha atuação no Parlamento e no Executivo, Prefeitura de Fortaleza e Governo do Estado do Ceará.Tivemos uma literatura bastante engajada durante a ditadura militar. Hoje nossos artistas se renderam à indústria cultural, de massa. Perdemos com essa opção mercadológica?Na presença da liberdade de expressão, manifestações ´marginais´ ou comprometidas politicamente tendem a desaparecer ou se reduzir significativamente. A indústria cultural é inevitável, não sendo em si mesmo um mal, enquanto oferta de produtos para uma sociedade de massa. Basta assegurar espaço para a cultura nacional, inclusive as manifestações locais e regionais. A cultura brasileira tem qualidade e consistência para resistir ao colonialismo cultural e até ser admirada por outros povos. O maior exemplo disso é a música popular brasileira.
A política deixou muitas marcas, mágoas?
Eu continuo na política. Marcas são sinais de luta. Mágoas, quem não as teve?
Serviço: O Rio da Minha Infância, de Lúcio Alcântara. Fotos de Joana França. R$ 15,00. Lançamento hoje, às 20 horas, no Salão Nobre do Ideal Clube, com apresentação de Carlos Augusto Viana. Toda a renda será revertida para a Casa da Vida do Hospital do Câncer.
FIQUE POR DENTRO - A escrita na solidão do poder - Ricamente ilustrada por sua sobrinha, Joana França, O Rio da Minha Infância mostra um pouco do passado do ex-governador. Frases que apenas dão pistas de sua trajetória, revelam ainda muito pouco. Atualmente vivendo a experiência de estar sem mandato, pela primeira vez em décadas, depois de se desentender com colegas de partido e perder no primeiro turno a reeleição para o Governo do Estado, Lúcio não pensa em escrever suas memórias. Pelo menos por enquanto, atém-se ao lançamento da nova produção literária. ´As duas publicações foram concebidas e realizadas enquanto estava no governo, embora só agora esteja lançando ´O Rio da Minha Infância´. Talvez porque estando cercado de muitos, estivesse, de fato, sozinho´, reflete o autor, que diz realizar um antigo sonho, com a fundação de uma editora, a Labirinto.
Um comentário:
Queria uma mensagem do escritor para os 50 alunso(de 08 aos 12 anos) do grupo Confraria de Leituras, de Maracanaú, que incentiva a leituras há 11 anos.
Prof. João Teles de Aguiar
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